Nós que vivemos em Volta Redonda estamos num vale. Quando sairmos no domingo, 01/03/2015, pedalando para a serra do Matoso vamos subir um bocado porque estaremos galgando a serra do Mar. Serra do Piloto, da Carioca, das Araras e do Matoso são picos da quase cordilheira, Serra do Mar.

Como vou te explicar isso? Mas veja bem, as grandes rochas, pedreiras, que veremos pelo caminho são muito antigas. Os geólogos chamam-nas de granitos plutônicos, de Plutão, o deus do interior da Terra. São derrames que vazaram do núcleo do planeta há seiscentos milhões de anos.

O montanhista Pedro Hauck, explica essa foto assim: “Para se ter uma ideia, alguns Granitos foram resfriados a mais de 30 quilômetros abaixo da terra e hoje afloram na Serra do Mar a mais de 1800 metros de altitude, imaginem quanta erosão não houve para que isso acontecesse, quanto tempo isto demandou para que todo este Granito aparecesse nesta altura".

A terra preta bem adubada que segura toda flora da serra do Mar é sedimento, rochas que se esfarelaram virando areia fina que misturada com restos de seres vivos, plantas e animais, é própria para sustentar a vida.

Então quando numa curva do caminho depararmos com o vale da Baixada Fluminense lá embaixo, lembre-se que estamos pedalando em cima de rochas muito antigas. Olha que distância de tempo: ela com 600.000.000 anos e eu, por exemplo, com 71 anos. Vamos respeitar!  

As serras catarinenses tem paisagens lindas e muitos caminhos a percorrer.

Quero compartilhar contigo o que fiz naqueles altos. Como tinha só um dia inteiro e parte do outro escolhi um trajeto curto, que vou descrever.

Desembarquei em Blumenau pouco antes da 9 h da sexta-feira, 13/02/2015, já uniformizado. Foi colocar a bagagem na bike e partir. Sai para a rodovia 047, peguei a pista do outro lado e segui em frente descendo num caminho bem junto a uma ponte. Adiante segui à esquerda e fui em direção a Timbó.

Trânsito intenso em pista dupla sem acostamento. No trevo peguei à direita para Pomerode numa pista apertada, mas com bem menos tráfego. A vegetação regional apareceu em todo seu esplendor, mas com as cores desmaiadas pelo dia encoberto.

Quase andando 30km cheguei em Pomerode que imaginei bem alemã, mas me decepcionei. Segui quicando pelo paralelepípedo  - toda centro das cidades tem o piso neste material para evitar altas velocidades – e seguindo a orientação das placas sai à esquerda seguindo para Rio do Cedro.

As matas aumentaram e as casas passaram a ter o estilo do sul, construídas em tábuas largas e cercadas de jardim com muitas flores.

No centro do lugarejo parei para um lanche e quando saí Deus me deu um presente, o pneu trazeiro arriado. Imagino-O falando a meu anjo: Ele rezou pedindo um tempo sem chuva, fresco em que pudesse ver e admirar minha obra, mas como ele não pediu facilidades arrie o pneu da bike.

Foi bom, a câmera esvaziava devagar e enchendo com a bomba dava para andar quase 10km antes de ter de parar e encher de novo. E assim foi pela longa subida de 22km.

Quando cheguei a ponte coberta e ao trevo soube que a subida ficaria mais pesada dali para frente. Em compensação o visual ficou mais bonito. mas se tivesse vindo no início de janeiro as beira-de-caminho estariam parecendo buquês gigantes de ortênsias.

Tudo foi coroado com a vista da represa de Palmeira.

A tarde caia e pela informação que tive restava outra subidona de 17km até a pequena Santa Maria. Não havia muito pra ver, então só pedalei. Subi muito, passou a hora da Ave Maria e a noite veio chegando devagar quando avistei a cidadezinha lá embaixo.

 Aí foi descer voando. Ali me avisaram que faltavam 9km até Doutor Pedrito e o fim do trajeto desse dia. Mas tinha uma serra na frente. Que viesse a serra. Ela veio, ultrapassei-a e cheguei ao meu destino. Eram quase 20 h o céu carregado abriu e o sol iluminou o alto dos morros. Daqui para diante as fazendolas são cobertas por plantação de arroz.

Na pensão de “dona” Hilda encontrei um quarto confortável, com toalhas e roupa de cama limpos e uma janta deliciosa. Dormi ou desmaiei. Amanhã, fala da continuação desse pedal, no sábado.     

Depois de uma noite de chuva furiosa a manhã chegou encoberta, mas com um vento que afastou qualquer chuvisco. Depois de um gostoso café fomos passear nas dunas. Não andamos 1km da casa de Marcus e Eliane e subimos os morros de areia.

 Senti-me como um viajante perdido no deserto e meio morto de sede. Andei pelos altos das dunas, rolei sobre a areia bem compactada pela chuva, pulei e me diverti muito.

 A manhã passou sem percebermos.

No dia seguinte ao sábado saímos numa caminhada entre uma floresta de casuarinas.

Lindo o jogo de sombra e luz no meio daquele exército de árvores.

 O chão coberto de agulhas marrons dava mais cor ao ambiente e as poças d’água refletiam o céu.

Dia maravilhoso.

Mas havia mais para fazer nesta ilha maravilhosa. E no domingo fomos a praia de Moçambique.

Mar-aberto as ondas batiam num ritmo intenso e peguei jacarés fantásticos.

A areia molhada pelas ondas dava um piso espetacular para se correr e corri até ficar um pontinho distante para o amigo Marcus e sua filha Cláudia.

Mas sendo ciclistas deixamos o dia anterior a segunda feira para rodear a ilha pelo lado leste de Floripa.

Correndo numa ciclovia só demarcada no asfalto visitamos o Parque Estadual do Rio Vermelho, passamos pelo canal que troca a água da lagoa da Conceição com a água do mar e tiramos fotos no mirante.

 Programação de tirar o fôlego.

- Então, Zé, quantos dias você ficou em Florianópolis?

Na realidade tudo isto foi feito hoje, 15/02/2015, o dia mais longo de minha vida, sem contar aquela vez que levei Lili em outra ilha, a de Paquetá e, num canto isolado fingi que estava perdido e juntos fizemos 58 tons de cinza, se não mais.

O Vale Europeu Catarinense é um espetáculo!

- Que vale, Zé? Nós – somos as pernas do Zé – “vimos” foram três serras ardidas. A que começa no Rio de Cedro e acaba nesta represa teve 22 km de subida e logo emendou na que vai para Sta. Maria, 17 km. Dá pra ver a represa lá ambaixo.

Então, que vale é esse que você viu, Zé?!

Como dizia antes de ser tão butalmente interrompido por minhas pernas... Alias, como dizia meu tio Aldário antes daquele vez que sentou num formigueiro: O que vem de baixa não me atinge.  

O que procurei, encontrei.

 Fui a Santa Catarina para ver o encontro entre a obra de Deus – na forma que a Natureza e as leis da Física e Química deram ao planeta – e a do homem com sua cultura. Foi lindo ver as casas ao estilo europeu em meio a beleza da flora da região.

 Eram casas em tijolo aparente ou de madeira em cores vibrantes ou na cor natural e envelhecida em meio a uma geologia maravilhosa.

 Assim, subindo serra ou pedalando nos vales, enchi meu coração de alegria.

Ando contado da minha viagem para pedalar em Santa Catarina.

 A última coisa que quero provocar em meus amigos e contatos é inveja. O que pretendo me pavoneando todo é dizer: meu amigo, se eu pobre aposentado posso, você também pode sair e conhecer o mundo de Deus. (ei, é o Zé pedalando lá na frente?)

Como qualquer para-choque de caminhão ensina: a inveja é uma merda. Olha só essa descoberta.

“Margaret Duffy, professora e presidente da comunicação estratégica na Escola de Jornalismo da Universidade de Missouri, diz que a forma como os usuários do Facebook usam o site faz muita diferença em seu bem estar. Ela diz: ‘se o Facebook for usado para ver o quão bem financeiramente um conhecido está ou quão feliz um velho amigo está em seu relacionamento – coisas que causam inveja entre os usuários – o uso do site pode levar a sentimentos de depressão. Descobrimos que se os usuários do Facebook sentem inveja das atividades e estilos de vida de seus amigos na rede social, eles são muito mais propensos a relatar sentimentos de depressão. É importante que os usuários do Facebook estejam cientes desses riscos para que possam evitar esse tipo de comportamento.’”

Estou alardeando o lugar lindo que vou visitar - ele é chamado de vale europeu catarinense por causa dessas paisagens da velha Europa - não é para meu amigo ficar espumando de raiva, mas para dizer: Ora, se o velho Zé consegue eu consigo também. Estou aqui, nesta vida, para animar e não pra derrubar.

A bicicleta como máquina que não é movida por força de cavalos mas humana serve bem para mostrar a nós mesmos que podemos vencer distâncias e alturas exclusivamente por nossa potência e determinação. A trilha do Wariors foi um bom exemplo disso.

Era madrugada e quatorze ciclistas saíram de suas camas e ganharam as ruas. O ponto de encontro da maioria foi o Voldac. Dali os carros com as bikes seguiram para Valença e Rio Preto. A padaria nem abrira ainda quando chegamos e depois de um café reforçado começou o inesquecível pedal.

Esta trilha tem três serras a serem vencidas: Funil (980m), Taboão e Itaboca (1080m). Enquanto lutávamos com as três subidas do Funil seis corredores de Valença passaram por nós num treino forte. Observe como os pés deles estão todos fora do chão!

Um lanche forte e seguimos pelo alto da serra subindo e subindo. O sol nunca foi forte, como em outros dias, mas ainda assim vez por outra parávamos numa sombra.

Um pedal longo assim precisa ser organizado e em Taboão a amiga Joana já estava com o almoço pronto e com litrões de cerveja estupidamente gelada. Ah como é bom juntar a vontade de comer com a fome! Esta foto é cortezia de um dos colegas, esqueci qual.

 Depois fomos para o parque nos refrescar na bacia da cachoeira. Foto do TarzanZé tirada por um dos amigos.

Mas o tempo não parava e ainda havia outra serra para vencer e mais dois trechos difíceis. O quartzito que forma os morros da serra de Itaboca atrapalha o pedalar mas é lindo de se ver. O visual era espetacular.

Outro lanche em Itaboca e pegamos um trilho, um caminho de um palmo de largura no meio da mata fechada. A tempestade da tarde rugiu, a chuva despencou, mas protegidos sob as árvores continuamos correndo e caindo.

 Quando atravessamos o rio do Boqueirão veio um prova forte para os ciclistas já cansados, carregar as bikes morro acima num caminho em zigzag e também na descida. Não tinha como pedalar.

 Mas logo chegamos em Cruzeiro. Outra parada rápida para hidratar e tomar uma pinguinha pra rebater a humidade do uniforme todo molhado e seguimos para a última etapa.

A volta para Rio Preto foi por estrada plana, porém com a chegada da noite e o esforço despendido por 14 horas cobrou a conta e chegamos todos muito sujos e cansados. Mas fomos vencedores.   

O corpo humano, que máquina maravilhosa. Estávamos na segunda subida da serra do Funil quando eles passaram por nós. Na foto os dois da ponta sobem num ritmo forte.

 Subindo num forte aclive como se estivessem descendo a ladeira.

 Pelo computador da bike nossa velocidade era de 6km a hora, e eles passaram lépidos, respiração normal, correndo a pelo menos 10km.

Eram seis atletas, guardei o nome do Ramon e do Fernando de Barra. Consegui ultrapassá-los numa descida e fiquei maravilhado de ver. Como deuses Mercúrio, com asas nos pés, mal tocavam o chão.

 Voavam.

A bicicleta respeita nosso ritmo humano e a velocidade com que nossos sentidos percebem as coisas. Um exemplo disso aconteceu na Trilha dos Warriors, 100 km de pedalada sobre os cumes da Serra Negra. Quando estávamos a 1.200 m do nível do mar, passando por um caminho todo forrado de quartzitos

e vendo o mar de morros estendendo-se para os lados de Bom Jardim de Minas,

pegamos a formidável descida que nos levaria a pequena Itaboca, perdida entre as montanhas. Se estivesse num carro com certeza essa pequena abertura na mata que margeia a estradinha, a 900m de altitude, teria passado tão rápido que não veria a cidadezinha.

Mas de bicicleta a gente para, aprecia o visual, pensa nas pessoas que vivem ali sem internet e outras facilidades do mundo moderno. Descendo vertiginosamente, a 700m lá estava ela de novo, desta vez mais próxima.

E de novo, no fim da ladeira a gente para, admira e fotografa.

Chegamos a Itaboca, eram 15:30 deste domingo, 01/01/2015.